ABRIL
EOSTRE ERA A DEUSA DO
AMANHECER para as tribos da Escandinávia.
Seu festival especial era o equinócio da primavera,
a alvorada do reinado do sol no ano setentrional. A tradição pagã falava do
"Rei do Ano", a vítima humana que era escolhida e sacrificada quando
o inverno se transformava em primavera. O corpo, enterrado nos campos, voltava
à vida por magia, com o crescimento do trigo.
Todos podiam celebrar o milagre de seu
renascimento ao comerem o pão que se fazia com esse trigo. O festival cristão
da Páscoa absorveu essas tradições pré-Cristãs. A partir dos cálculos de Beda,
a igreja católica inglesa celebrava a Páscoa no primeiro domingo depois da
primeira lua cheia depois do equinócio da primavera. Os fiéis eram estimulados
a experimentar a Paixão de Cristo em termos quase pessoais. Havia uma tradição
de que as pessoas deviam se abster de usar pregos ou ferramentas de ferro na
Sexta-feira Santa, por causa do ferro que perfurou as mãos de Cristo no
Calvário. No dia seguinte, os fiéis iam à igreja para um sombrio ritual de
vigília no sábado, seguindo Cristo para o túmulo. Cinco grãos de incenso eram
postos numa vela, representando as cinco chagas do Salvador.
Nas celebrações do Domingo de Páscoa, a
Eucaristia assumia um significado especial, já que a Páscoa era um dos raros
dias de festa — os outros eram o Natal e Pentecostes —, em que os membros
comuns da congregação tinham permissão para consumir o pão e o vinho. Não se
tratava de uma questão de doutrina, mas de disponibilidade. Afinal, não havia
tanto vinho e pão para se distribuir todas as semanas. O festival da Páscoa era
ainda mais apreciado pelas pessoas que se defrontavam com a realidade da fome.
Hoje assistimos à fome pela televisão.
Mas quase não é uma fonte de ansiedade
pessoal para as pessoas que vivem no Ocidente desenvolvido. É outra das
distinções cruciais entre nós e o ano 1000, quando a possibilidade da fome
sempre existia e atormentava a imaginação.
"Proverei... as necessidades da
vida", prometeu Piers Plowman, na fábula medieval, mas com uma condição:
"desde que a terra não falhe".
As pessoas datavam suas vidas pelos anos em
que a terra e o tempo falhavam. As páginas da Anglo-Saxon Chronicle relacionaram
os marcos de sofrimento:
975 - Houve uma grande fome...
976 - Nesse ano ocorreu a grande fome
na raça inglesa...
986 - Nesse ano a grande pestilência
chegou à Inglaterra, primeiro entre o gado...
1005 - Nesse ano houve uma grande fome
entre toda a raça inglesa, tão intensa que ninguém podia se lembrar de outra
mais terrível antes...
1014 - Nesse ano, na Véspera de São
Miguel (28 de setembro), uma grande inundação veio do mar, que se espalhou para
o interior, como nunca acontecera antes. Muitos povoados foram cobertos pela
água e incontáveis seres humanos se afogaram...
Esses eram os anos ruins em que os homens
eram obrigados a se ajoelhar e a pôr a cabeça nas mãos de seu senhor. Nem mesmo
o infanticídio era considerado crime. Beda relata uma comovente história de pactos de
suicídio entre as vítimas de uma fome em Sussex no século VI: "Com
bastante frequência, quarenta ou cinquenta pessoas emaciadas e famintas iam
para um penhasco, ou para a beira do mar, davam-se as mãos e saltavam para
morrer, da queda ou de afogamento".
O jejum era a maneira de a igreja orientar a
fome para propósitos espirituais. A Páscoa vinha ao final dos quarenta dias de
jejum da Quaresma. Como ocorria no final do inverno, quando os celeiros ficavam
vazios, havia
sentido no fato de a
Quaresma transformar a necessidade em virtude. O jejum era um processo que
elevava as preocupações materiais para um plano superior, um meio de
purificação pessoal e a atrair Deus para o seu lado.
Talvez a opção pela carência induzisse Deus a
conceder a abundância.
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