A caçada no ano 1000 ainda era um passatempo
democrático. As restrições à caça, introduzidas pelos normandos depois de 1066,
constituíram uma das principais fontes de atritos entre a população nativa e o
novo regime. Poder, magia e prazer da caça foram usurpados pela classe
superior.
O símbolo de autoridade do rei Athelstan era um juramento de fidelidade
prestado por todos os meninos na Engla-lond do século X (com exceção dos
escravos) quando chegavam aos doze anos: "Em primeiro lugar, todos vão
jurar em nome do Senhor, diante de quem toda coisa sagrada é sagrada, que serão
fiéis ao rei." No ano 1000, era
função do shire reeve (o reeve do condado, daí o nome xerife) do
rei visitar cada comunidade pelo menos uma vez por ano e exigir a prestação do
juramento, numa cerimônia cujo conteúdo religioso era significativo. A visita
do xerife freqüentemente ocorria em outubro, depois da colheita. Podemos
imaginar os meninos da aldeia, apreensivos, reunidos para o primeiro gosto das
responsabilidades adultas. "Assim
como cabe ao homem ser fiel a seu senhor", dizia a instrução real,
"sem discussão ou divergência, abertamente ou em segredo, favorecendo o
que ele favorece, repudiando o que ele repudia, a partir do dia em que este
juramento for prestado, ninguém esconderá qualquer violação, seja da parte de
um irmão ou de outra pessoa da família, seja da parte de um estranho."
Esse juramento, mais tarde conhecido como frank pledge (a responsabilidade
de cada membro de uma unidade pelo procedimento dos outros), era parte do
sistema de governo cada vez mais organizado na Inglaterra do século X, pelo
qual os sbires (condados) eram divididos em hundreds (centenas),
agrupamentos de mais ou menos cem famílias.
Em 1012, o devoto Alphege, arcebispo de Canterbury, descobriu à sua
custa o que podia acontecer quando os cães de guerra se embriagavam.
O arcebispo fora capturado pelos
dinamarqueses no ano anterior, sendo mantido como refém em condições de
aparente civilidade. Aproximara-se o suficiente de seus captores para converter
e batizar pelo menos um deles.
Até que uma noite, em Greenwich, quando os
nobres se reuniram, a nata dos generais e cortesãos do rei dinamarquês,
começaram a beber de um carregamento de vinho que viera "do sul", o
que obviamente exigia uma celebração especial. A diversão da noite culminou com
a aristocracia dinamarquesa atirando no infeliz arcebispo uma saraivada de
ossos e crânio da carne com que se banqueteavam. Alphege suportou bravamente
essa selvagem brincadeira, até ser atingido por um golpe decisivo. Caiu no
chão, sangrando... e morreu quando seu crânio foi esmagado pelo lado rombudo de
um machado de guerra empunhado pelo próprio nobre que ele convertera e abençoara
no dia anterior. O etos de camaradagem da fraternidade guerreira proporcionou o
tema predominante de sagas épicas como Beowulf ou The Battle of
Maldon. Não era uma Camelot. O cavalheirismo do rei Artur e seus Cavaleiros
da Távola Redonda foi uma fábula desenvolvida um século e meio depois, baseada
na possível existência de um chefe guerreiro britânico chamado Artur, que lutou
na sinistra confusão decorrente da partida dos romanos. É improvável que o
Artur do século VI demonstrasse qualquer cavalheirismo em suas ações.
A regra fundamental da guerra no ano 1000
era evitar a batalha sempre que possível. Os exércitos eram pequenos — uns
poucos milhares de homens constituíam um exército excepcional — e assim a
maioria dos combatentes conhecia os companheiros de vista. Neste ambiente
relativamente íntimo, havia menos possibilidade de ser morto do que na moderna
guerra mecanizada. As hostilidades eram iniciadas com o arremesso de lanças e
algumas flechas, provavelmente acompanhado por zombarias e gritos para animar
os combatentes. Os soldados ingleses usavam arcos resistentes de teixo, freixo ou
olmo, que podiam impulsionar uma flecha de ponta de ferro por uma distância de
cem metros. A um quilômetro e meio de
distância, ninguém ouvia coisa alguma. Sem armas de fogo e explosões, as
antigas batalhas medievais eram uma série de confrontações abafadas, animadas
apenas pelo estrépito metálico de espada contra espada e os gritos de guerra, "Dex
Aie" ("Ajuda de Deus") do lado normando e "Out!
Out!" ("Fora! Fora!") do inglês, enquanto rechaçavam os atacantes
que investiam contra sua muralha de escudos. É bem provável que os ingleses
soltassem seu grito no que consideraríamos um sotaque do North Country. Nenhum exército entrava em campanha no inverno, se pudesse
evitar; e durante o verão todos os homens em condições físicas tinham de
trabalhar na terra.
Em outubro, no entanto, os soldados já
haviam terminado a colheita, os celeiros estavam abarrotados. Era o momento
ideal para um ataque. Um ataque no
outono mais sério podia significar a ruína por sucessivas gerações. Montar a cavalo e o arco-e-flecha tinham
aplicações práticas óbvias, enquanto as estratégias do tabuleiro de xadrez ofereciam
uma metáfora para as manobras no campo de batalha. Desenvolvido no Oriente, o
xadrez alcançou a Espanha e o sul da França através dos árabes. Não se sabe
direito quando chegou na Inglaterra, mas um poema suíço da década de 990
descreve os movimentos da rainha e como o jogo termina, quando o rei leva um
xeque-mate. Não havia jogo de cartas no
ano 1000. Só surgiram na Europa no século XIV Mas temos indicações de que as
pessoas jogavam gamão e apreciavam o jogo da velha.
Nenhum comentário:
Postar um comentário